segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

Faith No More - Angel Dust

Esta é uma das bandas com que tive a sorte de crescer e como muitas outras da mesma altura nunca dei o devido valor, pelo menos, aquele que hoje lhes reconheço. Custa a assimilar toda a cacofonia de estilos musicais tão antagónicos como o metal, o rap, o funk e o pop, mas, assim que isso tudo entra no ouvido já daí não sai. Foi com a chegada de Mike Patton já no final dos 80´s que a banda adquiriu a assinatura que haveria de carregar até ao fim, no ano de 1998 em Lisboa. Uma capacidade vocal super elástica, teatral e, até, sobrenatural contrasta com a personalidade que assentou que nem uma luva no seio da banda como afirmou Billy Gould: “Nós somos pessoas socialmente atrasadas daí que tenhamos que fazer criancices para manter a sanidade mental”. Essas “criancices” consistiam em partidas levadas ao extremo da nojice e da loucura, cujas vítimas podiam ser membros do grupo (ou mesmo de outras bandas), da audiência ou qualquer um que se lhe passasse ao caminho. A irreverência e a técnica encontram-se com a originalidade e o brilhantismo, sendo o grande ponto de contacto este Angel Dust.

Em Angel Dust há poucas músicas que se possam individualizar das outras, em termos de diferenças estruturais, existem antes diferenças de orientação e de estilo. Em Caffeine e Malpractice temos uma influência mais metálica, enquanto, que em Midlife Crisis parece haver uma batida mais funk, já Crack Hitler e Jizzlobber mostram tendências mais experimentais. Destacam-se, RV, com a canção a fazer uma espécie de intervalo no álbum, com uns tons de blues e as duas covers em que o teclado de Midnight Cowboy faz uma entrada surreal para a popularíssima Easy. Predomina ao longo do registo momentos de génio, veja-se: as basslines de Everything’s Ruined e Kindergarten; a entrada de Be Agressive e a já referida Midnight Cowboy; os efeitos sónicos em Malpractice e o solo de guitarra em Be Agressive; A ginástica vocal em A Small Victory e a projecção atingida em Easy.

É um álbum de contrastes mas ao mesmo tempo muito fiel à mistura de géneros que invoca desde o primeiro momento. Esta aparente disparidade está presente até nas ilustrações da capa onde a famosa imagem do cisne esconde a foto da carne dos animais no talho. Não escondo também que se não fosse o meu irmão a comprar o CD, passados tantos anos do seu lançamento, estaria agora a ouvir a até à exaustão o mp3 de Midlife Crisis (Agora tenho o disco em repeat no leitor de CD).

quarta-feira, 24 de outubro de 2007

Rhapsody - Dawn Of Victory

Assim como que por piada, fiz a mim mesmo uma promessa que consistia, caso fizesse uma cadeira que persegue há já 3 anos (4 se quiser ser purista), em escrever sobre um álbum comprado nessa mesma época. Como podem deduzir pelo título fiz a cadeira, agora perguntam-se vocês: porquê Rhapsody? Porque são fases, porque já fui metaleiro noutra vida, porque foi barato, mas, o mais importante: porque até nem é mau e consegue mesmo ser muito bom para quem olhar para lá de toda a fantasia que ele invoca. Os Rhapsody são uma banda bastante curiosa no aspecto em que são excelentes músicos na sua maioria, mas, por qualquer motivo escolhem gravar sobre dragões e espadas sagradas. Fundindo estas duas últimas premissas temos um estilo que considero bastante sui generis que é o Symphonic Epic Hollywood Metal, rápido e furioso mas ao mesmo tempo clássico e melódico. Para quem acabou de baixar uma música da net e acha que se trata de uma grande patetice e que os senhores já tinham idade para deixar de jogar ao Magic: The Gathering, vamos elaborar mais especificamente sobre o disco.

Dawn of Victory, deve ser um dos registos de estúdio mais equilibrados da banda, isto tanto em termos sonoros como de estrutura musical. Como todos lançamentos da banda, conta uma história épica "The Chronicles of Algalord" e fá-lo bastante bem, como se de um Senhor Dos Anéis se tratasse pelo que não faz sentido isolar especialmente cada canção. Destacam-se: Lux Triumphans numa entrada clássica acompanhada pelos arranjos de voz que nos dão uma boa ideia da cultura musical do guitarrista Luca Turilli e do teclista Alex Staropoli (estes dois que são a força criativa do grupo); segue-se Dawn of Victory em toda a glória do Power Metal deixando desde já um aviso para quem não gosta do pedal duplo em tom frenético: é melhor que se habitue porque ele está presente em quase todas as faixas; Holy Thunderforce foi outro grande sucesso da banda e corre na mesma veia de Dawn of Victory, é o tipo de canção que sabe bem ouvir de manhã já que é plena de adrenalina e força suficientes para motivar qualquer um; Village of Dwarves abre com um interlúdio de voz e flauta para nos entregar às raízes folk do grupo; Trolls in the Dark consiste num breve instrumental que demonstra bem as capacidades técnicas de Luca Turilli; o álbum finaliza com The Mighty Ride of the Firelord em que a banda apresenta todo o seu reportório de truques na manga: uma entrada orquestral ao estilo de Hollywood, fortes coros vocais, variações de tempo, narrativas dramáticas e o final épico.

Como disse antes parece uma brincadeira de miúdos que se vestem de magos e guerreiros para jogar Warcraft, mas, é levado muito a sério pelo conjunto de Trieste e estes entregam aqui a sua obra-prima, ganhando o respeito do meio musical. Como a jornada que descrevem os Rhapsody, também eu, contra dragões e senhores da guerra acabei por conquistar algo que fugia desde tempos idos. Gloria! Gloria perpetua! For the dawn of victory!

quinta-feira, 6 de setembro de 2007

Third Eye Blind - Third Eye Blind

Cá estou de volta após o tradicional hiato de Agosto; e porque não aproveitar o sol de Setembro para recordar um dos discos mais vendidos da última década. O auto intitulado dos registos de originais dos Third Eye Blind é um dos meus favoritos, digo mesmo que em determinada altura senti-me capaz de escrever uma tese de doutoramento sobre o dito álbum. Obviamente que tentarei ser um pouco mais conciso: À primeira vista é mais uma banda de teen rock associada a filmes de adolescentes como American Pie, a chamada música de Verão, no entanto, perante uma análise mais cuidada percebe-se que estamos perante uma obra-prima da música popular moderna. O som perfeitamente produzido para reflectir o sentimento agridoce de música e letra brilhantemente escritas por Stephan Jenkins, a vertente experimental patente na procura de novos efeitos sonoros, misturando-se com as fórmulas que tanto apelam ao ouvido: é isso que podem esperar de um álbum de 3EB.

A primeira canção, “Losing a Whole Year”, é uma mini ficção moderna retratando episodicamente uma relação problemática, introduzindo ao ouvinte o som tipo da banda; “Narcolepsy”, claro está, refere-se a uma experiência do guitarrista Kevin Cadogan, ainda assim, muito bem escrita (ou não fosse Jenkins licenciado num curso de letras). Ao nível sonoro a canção destaca-se com os efeitos de Cadogan que espevitam o riff de Jenkins (tipo campfire song), saltando desde logo ao ouvido o pormenor do deslizar dos dedos na guitarra acústica de Jenkins (faz o som característico de “slide”) antes de dizer “I can feel this narcolepsy slide”; Segue-se a estrela da companhia, “Semi-Charmed Life”, o single de maior sucesso da banda e a tal música associada ao American Pie, e digo que até eu que nem sou de cair pelo refrão fácil me deixei apanhar, no entanto, como a própria banda afirmou, a canção soa bem e é atraente porque a sua construção musical é uma metáfora para a ideia que esta representa, mais concretamente, a letra fala-nos da auto-destruição no consumo de anfetaminas e a música ilustra a perspectiva da droga, de como parece aprazível e encantadora mas que por dentro é corrosiva; “Jumper” descreve a situação de uma pessoa que tenta convencer outra a não cometer suicídio, mais uma vez é tão alegremente retratada que não nos podemos deixar de questionar se o som não tenta emular com a letra tal persuasão. Fica na memória o som conseguido no solo de guitarra, parece simples… ou não; e fico-me só pela faixa 4 do leitor, porque, tenho muito para falar e me parece que isto é mesmo é para ser ouvido com atenção.

O equilíbrio perfeito entre os dramas domésticos de Jenkins (relações falhadas, violência doméstica, morte, vida, álcool, drogas, sexo e amor) e o som elaborado da banda foi atingido neste álbum que para mim é dos mais representativos do pop/rock norte-americano do final dos noventas. No entanto, um fraco apoio publicitário, a demora da banda em lançar discos devido à natureza perfeccionista de Jenkins (só três em 10 anos) e a mudança de pessoal fazem com que um grupo que podia estar a esgotar pavilhões pelo mundo fora esteja confinado à terra do tio Sam. Super-produzido, idealista, melodioso, despretensioso... e até vendeu bem.






segunda-feira, 23 de julho de 2007

Led Zeppelin - Bootlegs

Uma das razões pelas quais demoro tanto tempo para actualizar o blog está, curiosamente, interligada com um dos motivos para o manter. Quando se gosta tanto de música como eu é difícil arranjar tempo e palavras para descrever e analisar (de um modo descomprometido, entenda-se) algo que não tem que ser apreendido pela vista, nem processado no falso silêncio incandescente de um pc ligado à net. E por vezes não é evidente nestas linhas a entrega e o estado de espírito aquando da audição dos referidos discos, pelo que hoje num desses momentos de saudável loucura que é ouvir os Zeppelin ao vivo, tenha dado conta da transformação operada em mim. Compreendo que pagar uma quantia na ordem dos vinte e cinco a quinhentos Euros por artigo possa dissuadir o mais aberto dos espíritos, mas, chego à conclusão que não é só a peça de colecção (a raridade) nem o pacote de artwork que me fizeram (e provavelmente vão continuar a fazer) condenar a minha conta bancária à anorexia recorrente; somos transportados para um espectáculo único na história do rock.

Desfazendo um pouco nas palavras de Cameron Crowe (nas notas à The Soundtrack From The Film The Song Remains The Same): o som não transporta para o palco, nem a vista é das primeiras filas. Nem pensar… o som por vezes não é o melhor e olhamos para um horizonte de mais de trinta anos de muitas das míticas performances em palco dos quatro fantásticos que eram Bonham, Page, Plant e John Paul Jones. É algo igualmente saboroso: as fotos perdidas no tempo encontram agora um lar na posteridade dos milhares de edições piratas para nos fazer lembrar a arte de Jimmy ao deixar cair o braço na sua Les Paul, no sorriso de Robert, na classe de Jonesy e na imponência de Bonzo; a importância da qualidade sonora passa para segundo plano desde que consigamos distinguir aqueles momentos de génio em palco que só a maior banda de rock de todos os tempos é capaz de ascender, daí que quer venha da mesa, quer venha de um monitor ou ainda de um gravador dissimulado no casaco de um fã, o importante é o facto de ter sobrevivido a uma miríade de tormentas para chegar até nós. Os tempos em as canções eram reinventadas para melhor surpreender a audiência acabaram, pelo que hoje em dia nada resta a quem queira sonhar um pouco mais na pesada e inebriante noite dos Zeppelin senão estas pequenas sombras do que outrora foi real. Assim, cabe à nossa mente preencher as lacunas e reduzir o ruído de fundo para desfrutar mais uma vez das covers fenomenais de As Long as I Have you e Train Kept a Rollin’ na tour de 69 e ainda de Stand By Me em 72 (mais concretamente em Osaka), dos medleys fantásticos de Communication Breakdown em 69 e 70, daquela versão de The Rover num soundcheck de Chicago em 73 e da única gravação ao vivo de Out On The Tiles em 70 (e em “Blueberry Hill”), das piadas de Plant entre canções, da ponte que Page faz entre Misty Mountain Hop e Since I’ve Been Loving You nas tours de 72 e 73, das entradas do orgão de Paul Jones na Thank You em 70, sem esquecer o ataque às basslines de How Many More Times e na trovoada mais técnica que alguma vez veio da bateria de Bonham nas Achilles Last Stand de 77.

Numa clara e exaustiva retrospectiva sobre a minha infância encontro poucos indícios que expliquem esta paixão febril de adulto, daí que não me surpreenda o parco número de leitores destes discos. No entanto, solicito e desafio quem partilhe de uma fixação semelhante a descrevê-la nos comentários (e já agora quem possuir alguma das já referidas pérolas prateadas a trocá-la comigo), porque é disso que trata aqui: de todos os clichés possíveis e imaginários que nos fomentam o gosto de ouvir boa música.




sábado, 23 de junho de 2007

Alice in Chains - Dirt

Impõe-se na memória a recordação de um dia de chuva, algures no meu segundo ano de faculdade, uma noite para ser mais correcto. Vazio de forças e pleno de solidão, regresso a casa – via 31 em direcção aos Restauradores – e a canção da água faz-se ouvir nos intervalos de um Facelift em alta rotação no leitor de cd: definiu o paradigma da minha relação com Alice in Chains; e como um sorvo de whisky a sua pureza é incendiária. São os ecos de uma geração que sentiu o rude acordar dos 90’s e encontrou na droga a panaceia para esquecer a artificialidade dos 80’s. Com Pearl Jam, Soundgarden e Nirvana, os Alice in Chains encheram o espaço musical no início da década passada, diferenciando-se particularmente dos últimos pela qualidade técnica dos seus membros. Dirt (ironicamente: sujidade) é a expressão da sua glória.

O álbum abre com as metaleiras Them Bones e Dam That River e logo aqui se nota a melhoria no som, em relação a Facelift, que se apresenta mais trabalhado; uma das minhas favoritas, Rain When I Die, tem na sua introdução uma pequena demonstração da criatividade experimental de Cantrell (que seria explorada no próximo registo da banda Jar of Flies) e proporciona a Staley o espaço para fazer brilhar a sua voz (autêntica no panorama do grunge); Rooster é dedicada a Jerry Cantrell Sénior e o mínimo que se pode dizer é que a música acompanha a letra no asfixiante e claustrofóbico retrato de um cenário beligerante; Godsmack e Angry Chair são bons exemplos das muitas referências ao estilo de vida decadente de Staley; Em Down in a Hole está presente a faceta acústica de Cantrell (que foi exportada para os Ep’s Sap e Jar of Flies); De recordar o êxito de Would? que permanece ainda hoje um dos hinos da época (muito por culpa do filme de Cameron Crowe Singles ou Vida de Solteiro).

Hoje em dia assistimos a jovens engravatados de cabelos despenteados (provavelmente por um cabeleireiro) exclamando para quem ouça que a indústria atravessa uma crise de valores e que só querem fazer música, no entanto, pouco fazem para inovar. Podem não gostar do som cru e pesado (ou no meu caso do modo como Kurt Cobain se tornou um mártir sobrecotado), mas há que admitir, que estamos a falar de artistas a sério: assinaram por grandes editoras, tornaram-se vedetas e deixaram a sua marca; ainda que no fim não tenham aguentado a pressão, porque e convenhamos que, só queriam mesmo era fazer música.



segunda-feira, 11 de junho de 2007

The Beatles - Sgt Pepper's Lonely Hearts Club Band

Este lançamento completou recentemente o seu quadragésimo aniversário, facto que não relevou muito para mim, não me interpretem mal, quero dizer apenas que não tenho anos de vida suficientes que me permitam rejubilar-me perante tal marco. É uma questão que faz pensar um pouco sobre o que é muitas vezes “falar” de cds (analisando a música mas derradeiramente pronunciando-me sobre uma noção de acústica que importa tanto a matéria como a forma): por um lado temos aqui um marco inultrapassável da música contemporânea e a prova disso é a sua persistência no meio musical após quarenta anos de “vida”, por outro, está aqui um objecto que não me parece poder ser contemplado na sua plenitude através de um formato digital e que, numa análise mais subjectivista mas igualmente partilhada por muitos dos que conhecem os The Beatles, não é o seu melhor trabalho. O jornalista Charlie Gillett disse: “Eles parecem ter perdido o contacto com as suas próprias emoções”.

Os “Fab Four” já tinham a fama, a glória e o poder, Sgt Pepper’s só podia ser diferente de tudo o resto. Temos um álbum conceptual (que curiosamente não começou como tal) que ganhou vida própria, ainda que despejado de significado: as drogas (Lucy In The Sky With Diamonds), a amizade (With a Little Help From My Friends), a velhice (When I´m Sixty-Four), todas surgem retratadas “do outro lado do vidro” como que idealizadas para construir a canção pop perfeita. Setecentas horas dispendidas na sua elaboração e cento e vinte e nove dias de gravação ilustram a vontade em perseguir caminhos diferentes em estúdio, na captação de sons e na sua manipulação (de recordar os ultra sons no final de A Day in Life e logo depois uns segundos de conversas no estúdio completamente baralhadas e recortadas de forma a soar uma massa fónica sem sentido, com o intuito de chocar o ouvinte). Até o artwork exultava a exuberância de uma banda de individualidades, quando o projecto de Peter Blake se baseava na imagem do grupo no parque depois de um concerto, rodeado de uma colagem de figuras em tamanho real, isto depois dos The Beatles terem deixado de actuar ao vivo. Em Sgt Pepper’s vive o mito de um grupo demasiado grande sem nada mais a provar que não a sua existência.

Confesso a minha preferência pelos primeiros registos, mas reconheço que se saltaram barreiras com Sgt. Pepper’s e que bela altura para se estar vivo… não fosse o facto de daqui para a frente nada voltasse a ser como dantes: agravava-se a tensão entre os membros, caía Brian Wilson (vejam a apologia de Pet Sounds feita pelo Chico), o Flower Power entrava em crise e pouco tempo depois Janis Joplin, Jimi Hendrix e Jim Morrison faleciam, enquanto John, Paul, George e Ringo seguiam cada um o seu caminho. Um legado que a ninguém ficará indiferente.




sexta-feira, 11 de maio de 2007

King Crimson - In The Court of The Crimson King

Muitas foram as histórias que ouvi sobre o Rei Carmesim (incluindo uma episódica tarde em que eu e mais dois familiares somos raptados por uma visão dickensiana da minha pessoa daqui por mais vinte anos, e esta discute comigo o valor de King Crimson e Gentle Giant na cena progressiva dos setentas), no entanto nenhuma me conseguiu impressionar o bastante para admitir a genialidade de Robert Fripp & Lda., nem mesmo quando os Tool já o tinham feito. Mesmo depois disto tudo, resolvo-me a comprar uma cópia do In The Court of The Crimson King, gostei, mas não compreendi todo o culto em volta da banda, especialmente, as vozes que aclamavam Fripp como um “deus da guitarra” ou “o guitarrista mais influente de sempre”. Passemos uns tempos à frente, onde posso falar de outra perspectiva.

O álbum arranca com 21st Century Schizoid Man, onde Fripp revela a sua imagem de marca, o manancial de efeitos sónicos e uma distorção no mínimo inovadores para a época (foi lançado em 1969), apoiados pelos teclados perfeitamente orquestrados de Ian McDonald; sem esquecer os desempenhos fantásticos de Michael Giles na bateria, que iriam fascinar Bill Bruford (baterista dos Yes que mais tarde se juntou à banda), e de Greg Lake (que viria a fundar os ELP) dono de uma técnica irrepreensível no baixo e da voz que aqui aparece distorcida, justamente para pregar a visão negativa do futuro da sociedade, fornecida pelo lírico da banda Peter Sinfield. Segue-se, a que talvez seja a peça mais acessível de todo o álbum I Talk to the Wind, uma canção sensível onde McDonald brilha na flauta, Fripp faz uso dos harmónicos e a voz de Greg Lake se dilui suavemente na música. Em Epitaph a bateria de Michael Giles tem espaço para brilhar entre o Melotron de Fripp no que seria um dos clássicos da banda. Num dos mais subestimados registos do álbum, Moonchild, a flauta volta a brilhar na delicada e bucólica composição, no entanto, o momento alto reside no despique, quase sub-reptício, entre a guitarra e percussão (na vertente mais experimental do grupo). A conclusão chega em The Court of the Crimson King, um épico que nos faz levantar e adorar o “Rei” Fripp por ser o coordenador e visionário por trás de um dos melhores álbuns de estreia alguma vez editados.


Hoje encontro-me completamente rendido à originalidade dos King Crimson e digo que, às vezes é difícil de entender que uma peça musical reside na ambiência criada em sua volta, que nem sempre se pode exigir rapidez para consubstanciar o potencial técnico de um músico. Sensibilidade, entrega e a criatividade são baluartes de Bob Fripp. Lamento apenas a qualidade do som, que mesmo na edição remasterizada de 24 bits, continua um pouco inconstante e crispado, notando-se particularmente em Moonchild (onde toda a atenção é pouca para captar os harmónicos de Fripp). É um daqueles discos que agrada a quem se deleita a ouvir música, por ser um gosto adquirido, por “crescer” em cada vez que é tocado.


quinta-feira, 26 de abril de 2007

A.C.T - Last Epic

Tendo percorrido algumas obras mais reconhecidas e quiçá mainstream da minha discoteca, convido o leitor a procurar este pequeno pedaço de ambrósia oriundo da Suécia. Como esplendoroso acto que são na cena progressiva moderna, os A.C.T fazem da música um espectáculo que transcende as barreiras sonoras, elevando-nos para um plano lírico superior comandado pelo vigor instrumental e técnico dos seus intérpretes. Este conjunto escandinavo conta com influências de Queen, Journey e Dream Theater agitando um pouco o pote ao ritmo dramático de Fish. Foram recentemente acolhidos pela editora Inside Out que se propôs a reeditar os seus álbuns anteriores, entre os quais figura certamente este Last Epic, que chegou até mim através de uma inflacionada edição japonesa.

É com uma fluidez e suavidade assinaláveis que passam os sessenta minutos de canções articuladas conceptualmente. A história desenvolve-se na perspectiva dos habitantes do prédio em que a acção decorre, pelo que é construída uma atmosfera vibrante e dinâmica que dá justamente a ideia de que há vidas e personalidades distintas na narrativa. Apesar de ser um álbum conceptual, em termos instrumentais, as canções encaixam muito bem e fica sensação de tudo gira em torno da história, do álbum por assim dizer. Individualmente, há momentos de grande intensidade, o que seria de esperar de uma banda que alia uma técnica impressionante às melodias mais sentidas e emocionais, como bons exemplos disso temos Thorn by a Phrase e Manipulator. De notar também que somos preparados para esta pequena maratona musical com uma introdução que não nos deixa mergulhar de cabeça em Wailings From a Building e temos um Outro que nos deixa ficar na cadeira depois do “filme” ter acabado, suavizando o regresso à realidade.

É com música desta qualidade que sinto mais a exiguidade dos meus textos e reconheço que quem lê vai construir expectativas sobre algo absolutamente desconhecido, no entanto, pode mudar já isso: Deixo o link para a página dos A.C.T no MySpace e recomendo sem hesitações que tentem adquirir a edição remasterizada de Last Epic, agora que o grupo saiu da obscuridade e se encontra sob a égide da Inside Out.





quinta-feira, 8 de março de 2007

The Police - Outlandos d'Amour

Como já devem ter constatado, muitos dos álbuns sobre os quais me pronuncio têm uma carga sentimental bastante elevada, tal será o caso seguinte. Considero supérfluo apregoar a gente adulta gostos de adolescência, porque a música é uma arte, requer maturidade para ser devidamente apreciada, no entanto, é comum voltar atrás como que numa demanda pela espontaneidade, vigor e inocência que é frequente sentir a falta mais tarde. Aos 14 anos durante uma das minhas esporádicas visitas à grande Lisboa, fiz questão de visitar a uma das maiores discotecas da época: a Valentim de Carvalho; como sempre fui bastante objectivo nas minhas incursões não tive dificuldades em deparar-me com uma secção dedicada aos The Police. Da banda, conhecia apenas os maiores êxitos comerciais e um espectáculo ao vivo gravado em início de carreira, do qual retumbou no ouvido o tema So Lonely, pelo que acabei por comprar o primeiro registo de originais da banda de Newcastle (onde figura a dita canção). Lembro-me de ouvir um crítico afirmar (corajosamente, refira-se de passagem) que: “os The Police foram entre 79 e 83 o que os Led Zeppelin foram nos anos 70: a maior banda do mundo”, hoje compreendo essa afirmação.

Trata-se aqui de um álbum bastante directo: é música simples, apelativa e extasiante; é um equilíbrio saudável entre Stewart Copeland (mais punk) e Sting (mais jazz). Há temas como Next to You, Truth Hits Everybody ou Peanuts, que apelam ao rocker em nós e temas como Masoko Tanga, e Hole In My Life, que são mais trabalhados e fogem aos lugares comuns do mainstream, há depois o meio-termo revelado em Roxanne, So Lonely e Can´t Stand Losing You. Este é um dos álbuns mais honestos do trio, não há temas super produzidos como Wraped Around Your Finger ou Every Breath you Take, é apenas a energia de três músicos promissores (Stewart Copeland nos Curved Air, Sting era baixo de Jazz e Andy Summers nos New Animals) empenhados em encontrar a face do sucesso.

Hoje em dia já não são os detalhes fantásticos que sobressaem nas canções dos The Police que me levam a revisitá-los com tanta saudade, é antes o facto de poder ouvir artistas com talento e conhecimento suficientes para tocar música mais refinada, mas que no entanto preferem divertir-se e caminhar pela pauta prendendo a multidão em cada riff. É esta a melodia da adolescência e não tem que ser pensada em demasia, que nos traga antes humildade, pois a todos nos tocou e influenciou o que ouvimos hoje.




terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Genesis - Seconds Out

Foi aqui que tudo começou, a partir do momento que ouvi este álbum a minha visão da música nunca mais seria a mesma. Algures durante o meu 10º ano de escolaridade, acordo com a Carpet Crawlers no ouvido, tenho que a ouvir, tenho que a ter. Ao contrário de tudo o que conhecia até aí (vá, muito do que conhecia) não podia arranjar pelos canais normais, portanto, juntei algum dinheiro e corri as lojas de música da cidade. Não tinha os recursos que hoje tenho, o Lamb Lies Down On Broadway não era algo ao alcance de um capricho, felizmente tive a sorte de encontrar este Seconds Out. Do pouco que conhecia de Genesis sabia que tinha ali uma boa selecção de canções ao vivo, ainda assim, não eram cantadas por Peter Gabriel. Ignorei a saída de Gabriel e desfrutei do último lançamento com Steve Hackett, não podia ter ficado mais impressionado. Já não havia volta a dar:  Genesis não é tipo de banda que divulgamos aos amigos, é a música dos nossos pais (e não são todos), requer cultura e maturidade; depois da habitual futebolada reunimo-nos em minha casa e não resisti a mostrar a descoberta... bastaram os primeiros versos da Firth Of Fifth (e esta versão não abre com o solo de piano de Tony Banks) para arrepiar os quinze anos de juventude da plateia que passou a evitar o que pudesse sair dos meus headphones. Este álbum afastou-me um pouco da minha geração, no entanto, parece ter quebrado a barreira etária que me separava do meu pai: assim que lhe mostrei a aquisição ele dirigiu-se à prateleira dos discos de vinil e retirou de lá a edição que tinha, de 1977, assim como toda a discografia mais progressiva do grupo, que depois haviamos de comprar em CD.

É um dos mais genuínos registos ao vivo que conheço, pois adapta a técnica espectacular dos intérpretes e a teatralidade dos anos com Gabriel à voz e estilo de Phil Collins. A Carpet Crawlers sofre um pequeno corte nos primeiros versos (tornando-a ainda mais homogénea), a Firth Of Fifth perde a entrada de piano que tinha na versão de estúdio, a Lamb Lies Down On Broadway é tocada numa assinatura temporal mais rápida para depois lhe ser adicionada, como apêndice, o final da Musical Box. Mas nem tudo são cortes: O épico Supper's Ready é tocado na íntegra (com todas as limitações de uma versão ao vivo), a I Know What I Like é um momento espectacular de envolvimento com a audiência, Cinema Show conta com o contributo de Bill Bruford na bateria, e o album fecha com o trabalho fantástico de Phil Collins e Chester Thompson em Los Endos.

Foi esta uma das primeiras obras-primas que conheci e ainda hoje vou conhecendo. Volto agora a dar mais umas rotações a estes discos e não consigo deixar de estranhar quando começa Squonk (uma das mais belas do pós-75), como senti pela primeira vez que a ouvi, de tão habituado que estava à fase com Gabriel. Tal como não deixo de lamentar quando chego ao fim com Los Endos, completamente rendido à mestria da banda e à voz de Collins.

 

terça-feira, 23 de janeiro de 2007

Audioslave - Audioslave

Decidi fazer um prolongamento no revivalismo dos 70s e escrever sobre algo bastante recente. Já no novo milénio os sobreviventes de duas das maiores bandas do rock alternativo dos anos noventa juntam-se numa grande e ambiciosa produção. A fórmula era infalível: Brad Wilks, Tim Commerford e Tom Morello dos Rage Against The Machine com a voz de Chris Cornell mais conhecido pelo trabalho nos Soundgarden. Depois do fiasco musical que foi o Nu-Metal, esta era a banda que tinha os meios, o talento e a notoriedade para salvar o rock, eram os combatentes que chegaram ao novo século como heróis. Hoje a banda conta com três registos de originais e parece cada vez mais perto de concretizar o seu enorme potencial, no entanto, falta sempre alguma coisa, fica o sentimento de que preferem acomodar-se no espectro radiofónico ao invés de explorarem a rebeldia e a agressividade que os trouxe a este patamar. Por vezes sou demasiado exigente, no entanto, não esqueço que tudo o que os Audioslave lançaram até agora é de grande qualidade e este album é para mim cabeça-de-cartaz, tudo começou aqui.

Musicalmente falando, o que mais sobressaiu no regresso destes homens aos grandes palcos do sucesso foi a sua maturidade, já não há aqui a agressividade povoada com letras de intervenção política e social. Espera-nos um som intencionalmente reminiscente dos 70s (lá estou eu outra vez), com as palavras de um Chris Cornell fustigado pela bebida que encontra na música um escape e ao mesmo tempo os seus demónios. A faixa de abertura (e primeiro single) foi Cochise, uma clara demonstração do poderio da banda: temos os efeitos sonoros do exuberante Tom Morello na guitarra, o baixo pulsante de Tim C. que contrasta com o chocalhar frenético da tarola de Brad Wilks e a voz aguçada de Chris Cornell. Segue-se Show Me How To Live que é para mim a imagem de marca deste album: um hino incediário ao rock dos 70s. De destacar também Like A Stone que representa a faceta madura do grupo, o single de sucesso, a canção que lhes confere o inexorável estatuto comercial e deixou para a posteridade um dos mais melódicos solos de guitarra de Tom Morello.

Estes são os dias das nossas vidas, tal como passados mais de 10 anos da morte de Kurt Cobain se propagou a ideia de que Nevermind foi o album mais representativo do grunge, se após mais 10 anos me perguntarem se os Audioslave conseguiram salvar o rock... direi que sim.



quinta-feira, 18 de janeiro de 2007

Porcupine Tree - Signify

Não tinha ainda acabado o post anterior sobre os Floyd quando decidi escrever sobre Porcupine Tree (talvez inspirado pela imagem do lado), ainda que só agora tenha publicado. Hoje uma banda conhecida e reconhecida no panorama da música alternativa (se é que lhe posso chamar isso), chegou-me há uns tempos aos ouvidos este album como sendo uma das referências do space rock moderno, mas, muito ao estilo de Pink Floyd.
As duas partes Waiting deixaram-me siderado, a genialidade deprimente de Steve Wilson acaba por se estender por toda a música dos PT, ou não fosse ele o multi-instrumentalista que iniciou a banda. A voz distintamente british com toda a melancolia de uma tarde de chuva e os ecos do delay de uma Les Paul ou PRS são apoiados brilhantemente pelos Synths de Richard Barbieri e pelo baixo de Colin Edwin, enquanto que Chris Maitland vai emergindo discretamente na bateria para depois mostrar toda a sua técnica e espontaneidade nas partes mais psicadélicas do album.
Em Signify os PT continuam o excelente trabalho de The Sky Moves Sideways e Up The Downstair, de mencionar The Sleep of No Dreaming que podia ter sido um single de sucesso (como foi Karma Police dos Radiohead), ou a "spacy" Dark Matter que acaba o album em beleza. Este registo de originais é uma viagem escura pela mente de Steve Wilson e o momento de glória dos Porcupine Tree, que antecede a tour ao vivo na qual foi gravado o fantástico Coma Divine Live. Espreitem aqui...



sábado, 13 de janeiro de 2007

Pink Floyd - Animals

Os Pink Floyd são uma banda bastante multi-facetada no que diz respeito aos seus admiradores, isto é, se por um lado atraem milhões que procuram uma vertente da banda mais ear-friendly e mais mainstream, atraem por outro pessoas mais ligadas ao rock progressivo pelo trabalho musical da banda e em parte pelos primeiros albuns mais psicadélicos (isto são as tendências que observo). No que me diz respeito, considero-me bastante razoavel nesta "contenda", gosto do Piper at the Gates of Dawn e do A Saucerful of Secrets (com a acidez própria de Syd Barret), aprecio bastante o Meddle, mas para mim, é o ambiente e as neuroses da fase que tem início com o Dark Side of the Moon e termina com The Final cut, que realmente definiram a música dos Floyd.

Um album que me parece ser bastante esquecido é justamente este Animals, que foi lançado em 77, entre o Wish You Were Here e o The Wall. Nesta fase do grupo a influência de Roger Waters era completamente avassaladora e foi a sua inspiração no romance de George Orwell (Animal Farm ou Triunfo dos Porcos) que ditou o enquadramento lírico deste disco. Ao nível musical é um dos registos mais equilibrados da banda (aqui foi notória a contribuição de Gilmour), há um fio condutor no estilo que torna a sonoridade de Animals bastante diferente de Wish You Were Here e do The Wall, estes bastante mais dispersos. É sem dúvida um disco ideal para apreciar encostado na poltrona, com as duas peças acústicas Pigs On The Wing interpoladas entre a brilhante Dogs, a face mais rocker de Pigs e a controversa Sheep.

Sem canções passíveis de serem lançadas como singles, tornou-se um album ligeiramente ignorado pelas massas que parecem esquecer que mesmo a parte 1 da Shine on You Crazy Diamond tem um registo superior a 10 minutos. Ouçam aqui a Dogs e não se vão arrepender.



sexta-feira, 12 de janeiro de 2007

Led Zeppelin - Houses of the Holy


Uma vez comentei que, cronologicamente falando, a sonoridade dos Zeppelin poderia ser divídida em duas partes, sendo que a primeira durava até 72. Terá sido em minha opinião, a melhor fase da banda, a época que lhes garantiu o sucesso que ainda hoje conservam.

O ano posterior conheceu o lançamento do quinto registo de originais da banda: Houses of the Holy (curiosamente a canção que dá o título ao album não figura no mesmo, mas sim em Physical Graffiti) mostrou ao mundo que os Zeppelin não iriam ficar na sombra do sucesso de IV (four simbols, zozo ou untitled). Desde os primeiros acordes da The song remains the same que o ouvinte se apercebe da diferença de estilos, agora é tudo mais explosivo, mais carregado; o grupo vivia na sua apoteose e tinha consciência disso. Este album é tudo aquilo que os Zeppelin queriam ser (e muitas vezes eram) ao vivo: electrizantes com The song remains the same, The Ocean e The Crunge; pastorais com The Rain Song; esotéricos com No Quarter; e imprevisíveis com Dy'er Ma'ker.

Não estou de forma nenhuma a procurar fornecer aqui qualquer informação indispensável sobre os discos de que escrevo, é talvez o oposto, reconheço a minha parcialidade. A ideia deste blog é fazer com que o leitor não se acomode a tendências sociais ou estatísticas de vendas, que procure boa música fora dos canais mais óbvios (em termos relativos claro). No caso dos Led Zeppelin, IV é sempre a referência, mas, após várias incursões pela discografia do grupo, o ouvinte pode apreciar as vicissitudes e subtilezas que dão a cada album a sua genuinidade. É desta perspectiva que irei escrever.