sábado, 23 de junho de 2007

Alice in Chains - Dirt

Impõe-se na memória a recordação de um dia de chuva, algures no meu segundo ano de faculdade, uma noite para ser mais correcto. Vazio de forças e pleno de solidão, regresso a casa – via 31 em direcção aos Restauradores – e a canção da água faz-se ouvir nos intervalos de um Facelift em alta rotação no leitor de cd: definiu o paradigma da minha relação com Alice in Chains; e como um sorvo de whisky a sua pureza é incendiária. São os ecos de uma geração que sentiu o rude acordar dos 90’s e encontrou na droga a panaceia para esquecer a artificialidade dos 80’s. Com Pearl Jam, Soundgarden e Nirvana, os Alice in Chains encheram o espaço musical no início da década passada, diferenciando-se particularmente dos últimos pela qualidade técnica dos seus membros. Dirt (ironicamente: sujidade) é a expressão da sua glória.

O álbum abre com as metaleiras Them Bones e Dam That River e logo aqui se nota a melhoria no som, em relação a Facelift, que se apresenta mais trabalhado; uma das minhas favoritas, Rain When I Die, tem na sua introdução uma pequena demonstração da criatividade experimental de Cantrell (que seria explorada no próximo registo da banda Jar of Flies) e proporciona a Staley o espaço para fazer brilhar a sua voz (autêntica no panorama do grunge); Rooster é dedicada a Jerry Cantrell Sénior e o mínimo que se pode dizer é que a música acompanha a letra no asfixiante e claustrofóbico retrato de um cenário beligerante; Godsmack e Angry Chair são bons exemplos das muitas referências ao estilo de vida decadente de Staley; Em Down in a Hole está presente a faceta acústica de Cantrell (que foi exportada para os Ep’s Sap e Jar of Flies); De recordar o êxito de Would? que permanece ainda hoje um dos hinos da época (muito por culpa do filme de Cameron Crowe Singles ou Vida de Solteiro).

Hoje em dia assistimos a jovens engravatados de cabelos despenteados (provavelmente por um cabeleireiro) exclamando para quem ouça que a indústria atravessa uma crise de valores e que só querem fazer música, no entanto, pouco fazem para inovar. Podem não gostar do som cru e pesado (ou no meu caso do modo como Kurt Cobain se tornou um mártir sobrecotado), mas há que admitir, que estamos a falar de artistas a sério: assinaram por grandes editoras, tornaram-se vedetas e deixaram a sua marca; ainda que no fim não tenham aguentado a pressão, porque e convenhamos que, só queriam mesmo era fazer música.



segunda-feira, 11 de junho de 2007

The Beatles - Sgt Pepper's Lonely Hearts Club Band

Este lançamento completou recentemente o seu quadragésimo aniversário, facto que não relevou muito para mim, não me interpretem mal, quero dizer apenas que não tenho anos de vida suficientes que me permitam rejubilar-me perante tal marco. É uma questão que faz pensar um pouco sobre o que é muitas vezes “falar” de cds (analisando a música mas derradeiramente pronunciando-me sobre uma noção de acústica que importa tanto a matéria como a forma): por um lado temos aqui um marco inultrapassável da música contemporânea e a prova disso é a sua persistência no meio musical após quarenta anos de “vida”, por outro, está aqui um objecto que não me parece poder ser contemplado na sua plenitude através de um formato digital e que, numa análise mais subjectivista mas igualmente partilhada por muitos dos que conhecem os The Beatles, não é o seu melhor trabalho. O jornalista Charlie Gillett disse: “Eles parecem ter perdido o contacto com as suas próprias emoções”.

Os “Fab Four” já tinham a fama, a glória e o poder, Sgt Pepper’s só podia ser diferente de tudo o resto. Temos um álbum conceptual (que curiosamente não começou como tal) que ganhou vida própria, ainda que despejado de significado: as drogas (Lucy In The Sky With Diamonds), a amizade (With a Little Help From My Friends), a velhice (When I´m Sixty-Four), todas surgem retratadas “do outro lado do vidro” como que idealizadas para construir a canção pop perfeita. Setecentas horas dispendidas na sua elaboração e cento e vinte e nove dias de gravação ilustram a vontade em perseguir caminhos diferentes em estúdio, na captação de sons e na sua manipulação (de recordar os ultra sons no final de A Day in Life e logo depois uns segundos de conversas no estúdio completamente baralhadas e recortadas de forma a soar uma massa fónica sem sentido, com o intuito de chocar o ouvinte). Até o artwork exultava a exuberância de uma banda de individualidades, quando o projecto de Peter Blake se baseava na imagem do grupo no parque depois de um concerto, rodeado de uma colagem de figuras em tamanho real, isto depois dos The Beatles terem deixado de actuar ao vivo. Em Sgt Pepper’s vive o mito de um grupo demasiado grande sem nada mais a provar que não a sua existência.

Confesso a minha preferência pelos primeiros registos, mas reconheço que se saltaram barreiras com Sgt. Pepper’s e que bela altura para se estar vivo… não fosse o facto de daqui para a frente nada voltasse a ser como dantes: agravava-se a tensão entre os membros, caía Brian Wilson (vejam a apologia de Pet Sounds feita pelo Chico), o Flower Power entrava em crise e pouco tempo depois Janis Joplin, Jimi Hendrix e Jim Morrison faleciam, enquanto John, Paul, George e Ringo seguiam cada um o seu caminho. Um legado que a ninguém ficará indiferente.